25/07/2012

História da Idolatria na Igreja

A Igreja dos primeiros séculos não usava imagens (com excepção do símbolo do peixe, usado como logotipo e não como ídolo). As imagens entraram primeiro na Igreja para uso ornamental, no final do século III. Em 400 d.C., elas também eram usadas com propósitos instrutivos e só nos séculos seguintes essas imagens foram consideradas sagradas. Foram então aceitas para veneração pela Igreja Católica Romana no Concílio de Nicéia, em 787 d.C. e no de Trento, em 1.562 d.C.

De acordo com a Tradição Católica, quando uma pessoa ora ou adora uma imagem de santo ela está venerando o próprio santo, não a imagem. Esta explicação, embora convincente quanto pareça, não justifica a oração a uma imagem, porque Deus no-la proíbe. Este fato tem sido entendido por muitas pessoas importantes na Igreja Católica. Sob a mudança feita pelo Papa João XXIII, muitas imagens foram retiradas das Igrejas. Este Papa e outros que o seguiram também tentaram cortar outras práticas idolátricas da Igreja, como carregar imagens em procissões.

Imagens de Quem?

Na maioria dos casos as imagens veneradas não são realmente imagens de santos, visto como não existiam câmaras fotográficas no seu tempo de vida, nem muitos deles posaram para pintores. A consequência óbvia é que muitas vezes as imagens são realmente dos modelos que posaram para os pintores. Muitos artistas

19/07/2012

Magistério e Começo do Poder Eclesiástico

 Ícone retratando o Primeiro Concílio de Niceia.
O bispo de Roma Leão Magno foi o primeiro que falou no direito que os bispos têm de mandar nos cristãos

Desde o começo, os apóstolos estabeleceram auxiliares. Assim nos informa Clemente Romano. Estes auxiliares eram chamados "episcopói" ou ''presbiterói". Também as cartas de Inácio de Antioquia (100-115) dizem a mesma coisa, talvez repetindo Clemente...Também Cipriano, bispo de Cartago, repete Clemente.

Para todos, porém, é coisa evidente que os bispos são autónomos em suas assembleias (Igrejas); "quando muito, comunicam-se uns com os outros mediante cartas exortatórias ou doutrinais, ou simplesmente pedindo esclarecimentos.

Assim Clemente de Roma escreve ao bispo de Corinto; assim Dionísio, bispo de Corinto, escreve ao bispo de Roma... Surge, aos poucos, para facilitar as consultas entre si, o cargo dos metropolitanos, cujas sedes são: Antioquia, Cesareia, Jerusalém, Alexandria e Roma.

Os bispos que pertencem a uma sé metropolitana, vez ou outra se reúnem em sínodos para confrontarem suas ideias, ou para julgarem as ideias de algum cristão que pensa diferente (herege), ou para solucionar casos duvidosos.

Só com o concilio de Nicéia, em 325, é que a coisa toma vulto oficial e imperial... Notamos aqui, de passagem, que os primeiros nove concílios se realizaram todos no Oriente e os bispos de Roma não estiveram presentes em nenhum deles, tão insignificante era a igreja de Roma!

Foi a partir do século V que os bispos de Roma tentaram reservar-se o poder de confirmar as conclusões destes concílios, baseando-se no fato de serem bispos da antiga capital do mundo. Veremos isto mais à frente.

Voltemos agora ao bispo Clemente Romano, iniciador da ideologia do poder, dando continuidade ao artigo passado.

Eusébio, bispo de Cesareia (265-340) e fundador da História Eclesiástica, nos deixou escrito (livro III; c. II) que, com a morte de Tiago, primeiro bispo de Jerusalém, "os apóstolos, os discípulos e os parentes vivos do Salvador juntaram-se para dar-lhe um sucessor e, por consenso unânime, elegeram Simão Pedro". (Parêntese: então, o primeiro sucessor de Jesus e papa, seria Tiago!?).

Ora, na citada carta aos Coríntios, o bispo de Roma, Clemente, nos confirma que esta regra ainda perdura na Igreja de Jesus. Não só isso, mas, em Nicéia (325), os bispos presentes confirmaram ser este costume ininterrupto.

Hoje, sabemos que o XXII cânon do Concilio de Cartago "proibia aos bispos ordenar padres sem o consentimento dos demais sacerdotes e sem a presença e aprovação dos leigos".

E o bispo de Roma, Leão Magno (440-461) fez uma lei para a sua Igreja, onde se lê que "aquele que por direito terá que mandar em todos, haverá de ser eleito por todos".

É um ato de democracia eclesiástica, sem dúvida, que esconde uma realidade que já era aceita por todos – leia-se, de novo, o que São Leão Magno escreveu: "aquele que por direito terá que mandar em todos...". Fala-se de "direito" e fala-se de "mandar".

Ora, mandar é um ato de jurisdição que implica em "poder" - neste caso, poder eclesiástico que se fundamenta em direitos...

O que é poder eclesiástico? O que são estes direitos? Poder eclesiástico é de difícil definição... É um poder muito elástico, que pode ser esticado no tempo e no espaço, quilómetros afora... Na sua formulação inocente parece algo que tem a ver com a vida da alma... um poder espiritual.

Mas, ao longo dos séculos, passou da alma dos fiéis ao corpo dos fiéis (lembra da Inquisição?) e do corpo dos fiéis passou à terra dos fiéis (lembra a doação de Constantino? e da terra dos fiéis passou aos reinos, ao Ocidente, à terra inteira... (lembra do Tratado de Tordesilhas, em 1494?).

E o poder eclesiástico (elástico como é) se fundamenta em direitos adquiridos. Quais são estes direitos adquiridos dos presbíteros e dos epíscopos?

Para entender isto, voltemos ao começo. Já na época do bispo romano Clemente não era reconhecido à igreja de Roma, no âmbito da cristandade, nenhuma autoridade sobre as demais igrejas do Oriente ou do Ocidente.

Veja-se por exemplo, a luta escandalosa entre Cornélio e Novaciano, na metade do III século, querendo ambos ser bispos de Roma. Foram excomungados por um sínodo romano, mas a resposta definitiva reconhecendo Cornélio como legítimo bispo de Roma, veio do sínodo de Cartago (África).

O mesmo aconteceu quando um sínodo espanhol depôs Marcial, bispo de Mérida, e Basilídio, bispo de Lyon, por terem traído a fé na perseguição de Gallo. Os dois apelaram ao bispo de Roma, Estêvão, que os reintegrou. Mas um outro sínodo de Cartago (África) anulou o ato do bispo de Roma, confirmando a decisão do sínodo espanhol.

Cornélio, bispo de Roma (251-253), gritava que era a ele que competia decidir estas coisas, por ser Roma a capital do império, mas ninguém lhe deu ouvidos.

Assim, quando se tratou de fixar a data da Páscoa, não é o costume da Igreja de Roma que vale, mas o que determinam os concílios provinciais de Cesareia, dq Ponto, da Gallia e da África, que, seguem o exemplo de Alexandria (Egito), enquanto que as pretensões de Victor I, bispo de Roma (189-199) foram derrubadas pelo bispo de Éfeso.

Assim, depois da perseguição de Décio é ainda o concilio de Cartago, convocado pelo bispo Cipriano, que resolve a questão da reconciliação dos apóstatas e o bispo de Roma nem mesmo é consultado.

Aconteceu o mesmo com o batismo dado pelos hereges: é ainda o bispo de Cartago, com os demais bispos africanos, que impõe as regras. (Veja: Santo Agostinho; "De Batismo" livro II; c. XV).
Temos dezenas de outros exemplos parecidos com esses que acabamos de citar, como, por exemplo, o caso de Paulo de Samosata; o cisma donatista; a teologia de Ário; etc.

Em todos esses casos, eram os concílios episcopais das diferentes igrejas que impunham o seu parecer, desfazendo, frequentemente, o parecer do bispo de Roma. (Veja: Fleury; "História Eclesiástica"; livro VII; 56).

É pena que quem redigiu a lista dos papas na enciclopédia Mirador, tenha colocado sob o título "principais eventos" muitas afirmações que não têm nenhuma prova histórica.

Esses fatos acima relatados nos colocam já diante de uma situação aceita no mundo cristão de então; uma situação que enquanto mostra a falta do primado romano, nos primeiros séculos, salienta o direito de cada bispo (esteja ele onde estiver) para decidir questões dogmáticas e disciplinares.


18/07/2012

A Roma do Primeiro Século

http://pt.wikipedia.org/wiki/Roma
A tristeza da situação política não impedia que os cristãos do primeiro século vivessem como uma família.
A Roma do primeiro século vivia uma situação política bastante triste. Tibério (14-37 d.C.) era um imperador de dupla personalidade. A maioria dos historiadores tecem elogios à sua administração, esquecendo a sua violenta tirania e despotismo, em nome da razão de Estado. Mas os cristãos (confundidos com os judeus) não tinham do que se queixar.

A Tibério sucedeu Calígula (37-41 d.C), tão cínico que, para insultar o Senado, deu as honras de Cônsul ao seu cavalo! Na "História dos Césares" é apelidado de “animal ferox”, tamanha era a sua crueldade. Por fim, foi assassinado por Cláudio, o capitão de sua guarda pessoal. E foi uma festa pelo império afora.

Sucedeu-lhe Cláudio (41-54 d.C), um homem irresoluto e tímido, e tão covarde que consentia que Calígula o esbofeteasse e o chicoteasse em público. Uma vez imperador, mandou matar todos seus amigos, a um ponto que Agripina mandou envenená-lo.

Então, Nero subiu ao trono (54-68 d.C): a pior desgraça da Roma antiga! Mandou matar sua mãe, Agripina, e seu mestre Séneca e dezenas de amigos. Isso já no começo. Então casou-se com um homem, praticando relações sexuais à luz do dia, na presença de sua corte.

As demais loucuras, atrocidades e crime de Nero, todos as conhecem. Mas não podemos esquecer a noite de 19 de julho do ano de 64, quando ele mandou incendiar Roma e, depois, colocou a culpa nos cristãos.

Talvez fossem cerca de 200 cristãos, vestidos com túnicas impregnadas de pez negro, que queimavam como tochas vivas. Foi a primeira e mais terrível perseguição contra os cristãos e o testemunho de que, em Roma, já havia uma pequena comunidade, embora não se tenha registros históricos de seus fundadores - certamente não São Pedro, como mostrei nos artigos passados.

Finalmente, o povo se revoltou: invadiu o palácio e acabou com Nero. Sucedeu-lhe, primeiro, Galba, e, depois, Otão e Vitélio, tolos ineptos e corruptos, particularmente este último, que era também sádico e sanguinário.

Então Vespasiano tornou-se imperador (69-79 d.C). Era bondoso e condenava as crueldades de seus antecessores. Sucedeu-lhe Tito (79-81 d.C.), que o povo apelidou de "delícias do género humano". Quando morreu, o povo dizia: "Um imperador como este, ou nunca devia ter nascido ou devia viver para sempre".

Sucedeu-lhe Domiciano (81-96 d.C.), homem orgulhoso, fútil, avarento e cruel. Desencadeou a segunda perseguição contra os cristãos. O prazer de Domiciano era matar pessoas e dá-las aos cães para comer. Outra diversão desse monstro era mandar queimar os órgãos sexuais de amigos.

Foi assassinado. Sucedeu-lhe Nerva (96-98). O historiador Apolónio, que viveu nessa época, diz que Nerva era benévolo, generoso e modesto. Todos os historiadores romanos louvam e admiram Nerva, com o qual começa a dinastia antonina.

Nesses altos e baixos políticos a vida dos cristãos em Roma certamente sofria, mas não tanto para ficarem dispersos. Muito pelo contrário! Era uma comunidade pequena, mas muito unida.

Embora o período que foi do ano 70 ao ano 110 seja completamente obscuro quanto à história, podemos ter alguma notícia por meio de Ireneu e de Inácio. São notícias misturadas à ideologia do poder eclesiástico do qual os dois estavam, imbuídos. Mas quem nos fornece as melhores notícias é já a Arqueologia Paleo-cristã.

Tenho aqui â importantíssima obra de Giovanni Battista De Rossi: "Roma Sotterranea" (Roma Subterrânea), escrita entre os anos de 1864 e 1877.

Esse De Rossi, arqueólogo e epigrafista italiano (1822-1894), fez o levantamento topográfico das catacumbas de Roma; foi o criador da Epigrafia Cristã; organizou o Museu Cristão do Latrão e redigiu, a partir de 1863, o Boletim de Arqueologia Cristã, com a assistência da Comissão Vaticana de Arqueologia Sagrada.

Os túmulos que ele descobriu e os sarcófagos que ele descreveu nos apresentam os mais antigos símbolos, pinturas e objetos deste primeiro século de vida cristã.

Encontramos lá o alfa e o ómega (Deus, princípio e fim); muitas âncoras (a cruz da salvação); muitas palmas (a vitória sobre o paganismo); o cordeiro (o fiel do Cristo); o peixe, cujo acróstico, em grego, significa: "Jesus-Cristo-Filho-de-Deus-Salvador"; o pastor (o bom pastor da parábola); o pescador (Jesus em busca dos homens); o orante (a Igreja em oração); e muitas outras imagens.

Às vezes, a tampa do sarcófago tem cenas tiradas da mitologia e passíveis de uma interpretação espiritual: Orfeu enfeitiçando os animais (Cristo fascinando os alunos); Eros abraçando Psique (o amor celeste envolvendo o amor humano); Ulisses amarrado ao mastro para resistir ao canto das sereias (o cristão desdenhando o mundo profano).

Além dos sarcófagos, encontramos as pinturas rudimentais, sobretudo nos muros e nas abóbadas dos

14/07/2012

A Organização da Igreja Primitiva

A Igreja primitiva era fraternal e não havia sinais de ideologia eclesiástica de poder algum

Lemos em "História da Civilização" de Will Durant (Comp. Ed. Noc; SP; 1946; V; VI; III p.; I. II; pág. 276): "O cristianismo não destruiu o paganismo, mas adoestou-o. O moribundo espírito grego ressurgiu na teologia e na liturgia da Igreja cristã. A língua grega, depois reinar tantos séculos sobre a Filosofia, tornou-se o veículo da literatura e do ritual cristão"

“Os mistérios gregos passaram-se para os mistérios da missa. Outras culturas pagãs também contribuíram para esse sincretismo. Do Egito vieram as ideias da divina Trindade, do juízo final, e da imortalidade pessoal com recompensas e castigos."

“Também de lá vieram a adoração da mãe e do filho e a mística teosofia que produziu o Neoplatonismo e o Gnosticismo que obscurecem o credo cristão. De lá ainda [vieram] os germes do monasticismo cristão. De Frígia veio a adoração da grande mãe. Da Síria, o drama 'da ressurreição de Adonis."

"Da Trácia talvez tenha vindo o culto a Dionísio, o deus que morre para salvar os homens. Da Pérsia veio a ideia do milénio, as 'idades do mundo', a conflagração final, o dualismo Deus-e-satã luz-e-trevas. Já no quarto evangelho Cristo é a luz brilhando nas trevas; uma luz que as trevas nunca apagaram."

"O ritual de Mitras assemelha-se tanto ao sacrifício da missa que os padres cristãos acusavam o diabo que inventara essas semelhanças com a finalidade de desnortear os espíritos fracos: como afirmavam Justino em Apologia (I, 6G) e Tertuliano em De Baptismo (5). Deste modo o cristianismo foi a última grande obra do velho mundo pagão!"
E o mais interessante de tudo é que a síntese de Will Durant é verdade histórica (para os pesquisadores - claro! Não para o povão...), mesmo que teólogos católicos e protestantes tentem negá-lo. (O problema é que se encontra um só pesquisador entre mil teólogos... Os teólogos só fazem repetir o que foi dito!).

Voltando a Will Durant, acho que ele esqueceu de acrescentar uma frase: "este cristianismo que vingou não é o cristianismo de Jesus Cristo, e, sim, o cristianismo dos seus vigários, moldado "ad usum Delfini".

Foi por isso que o grande pesquisador, o padre Altai, cujo verdadeiro nome é Mélinge, nascido em Saintonge, na França, escreveu o livro "O cristianismo de Cristo e o dos seus vigários" (Federação Espírita

11/07/2012

Onde Está a Tradição do Primado Nos Primeiros Três Séculos?

Nos primeiros três séculos não existe nem a idéia de um Primado romano

Mais uma vez lembro que esta não é uma história do cristianismo e, sim, tão somente dos homens que ocuparam o cargo de bispos em Roma.

Existe uma dificuldade muito grande em escrever este tipo de história que estou tentando redigir porque o historiador católico se esforça para justificar e defender a posição do bispo de Roma, interpretando e até forçando o sentido de situações históricas e de documentos que chegaram até nós, não na sua forma original mas através de citações.

Veja, por exemplo, o verbete "Papado" na Enciclopédia Mirador, edição 1980, página 8530: "São Clemente I escreveu carta aos Coríntios em 95 ou em 96; esta é uma das primeiras provas do primado romano".

Ora, isso só pode ser verdade para quem escreveu o artigo; para outros que gostam de analisar e investigar, esta é uma grande mentira, pois trata-se de uma verdade preconcebida.

Por causa disso, temos centenas de conclusões apressadas que distorcem os fatos e dificultam a pesquisa.

Para provar a existência do Primado romano nos primeiros três séculos, citam-se três bispos: Clemente romano, Irineu e Cipriano.

Clemente foi bispo em Roma de f, 88 a 97 d.C. e tornou-se famoso por uma carta que escreveu aos cristãos de Corinto ("Carta de Clemente romano"; Editora Vozes; Petrópolis; 1971). Quem nos fala desta carta é Eusébio em "História Eclesiástica" (IV; 23,11).

Eusébio, que morreu em 340, isto é, pouco mais de 200 anos depois, nos diz que o bispo de Corinto leu essa carta aos fiéis e depois guardou-a como preciosidade por ter vindo de Roma... Duzentos anos depois!! Eusébio nos relata este fato... sem provar!...

Irineu, bispo da Igreja de Lyon que dependia do metropólito de Roma, e morreu em 208, isto é, cerca de 100 anos depois de Clemente romano, deixou escrito em "Adversus Haereses" (III, 3) que Clemente foi o terceiro sucessor de Pedro em Roma, após Lino e Anacleto, e enviou uma carta aos cristãos de Corinto.

O que há de interessante nessa carta de Clemente? De interessante há que ele faz uma comparação entre o exército romano e os grupos dos cristãos: para serem invictos como o exército romano, os cristãos devem observar uma severa disciplina eclesiástica onde deve haver uma hierarquia com chefes e subalternos.

Com efeito, escreve Clemente, "os apóstolos estabeleceram bispos e diáconos e deram instruções para que, após a morte deles, outros homens comprovados sejam eleitos presbíteros da comunidade" (47,6; 54,2; 57,1).

A interpretação dos teólogos católicos é que esta carta é o primeiro documento comprovante da supremacia universal (o Primado) do bispo de Roma. No entanto os teólogos luteranos e outros protestantes (S. Jáki; "Les tendences nouvelles de 1'ecclesiologie"; Her-der; Roma; 1957) não vêem nenhum Primado na carta de Clemente.

Clemente não era o único bispo que mandava cartas ou relatórios a outros bispos, tanto em forma de consulta, como em forma de esclarecimento. Aliás, como podemos ler no "Curso de Teologia Patrística", de F. A. Figueredo (Ed. Vozes; 1983; pág. 67), Clemente não faz alguma distinção entre "epíscopoi" (bispos) e "presbiterói" (anciãos); por "presbiterói" ele designa bispos e diáconos.

É evidente que nessa carta o termo "episcopói" significa sorvelhante, supervisor, sem a conotação de pessoa "consagrada" para um ministério específico, em oposição a "leigos" que seria o povo cristão não consagrado (como interpreta I. de la Potterie em "Nouvelle Revue Théblogi-que"; LXXX; 1958; pág. 840 ss.).

Não se deve esquecer que muitos bispos, nesta época, escreviam cartas a outros bispos, Diniz, bispo de Alexandria, escreveu cartas; até aos bispos da Espanha, resolvendo questões disciplinares, que eram aceitas por outros bispos (-Fleury; "Hist. Ecles"; VII; 56).

O mesmo fez Gregório, bispo de Neocesaréia, no século III e Ba-sílio, bispo de Cesaréia; e suas intervenções eram aceitas pelos demais bispos.

Quando nos fins do século III o império foi dividido em: Oriente, Illíria, Itália e Gallia, constituíram-se os patriarcados de Roma, Antioquia e Jerusalém; mas cada bispo estava sujeito à assembléia dos bispos de seu patriarcado.

Mas a grande importância da carta de Clemente aos Coríntios, se não é a prova do Primado, como queria B. Bartmann no seu Tratado de Teologia (vol. II; pág. 425 e 483) e os demais teólogos católicos, está no fato que ele dá início à formação do presbiterado, como prova muito acertadamente Ernesto Renan ("História das

09/07/2012

A Roma Cristã e seu poder estão fundamentados sobre a Roma pagã


Atenção, leitor! Esta obra que estou começando a escrever não é Histó­ria do Cristianismo ou História da Igreja cris­tã, mas tão somente a história dos homens que ocuparam o cargo de bispos na cidade de Roma. Vou falar de homens e de sua ideologia do poder. Só.

Nos casos específicos dos bispos de Roma chamo de ideo­logia a interpretação que os mes­mos fizeram e fazem de uma si­tuação religiosa que tem um as­pecto social e político.

Essa interpretação acontece a partir de uma evolução histó­rica para a qual confluíram elementos políticos, morais, religio­sos, filosóficos e econômicos que implicaram numa tomada de posição, de modo que em primeiro lugar foram elaboradas doutrinas para justificar aquela interpretação e, em seguida, foram tomadas as medidas que se julgara necessárias para a realização do sonho interpretativo de situação já programada, para realizá-lo com referência ao poder.

Neste caso, a "ideologia do po­der" é o sonho espalhado no gran­de círculo eclesiástico romano que justifica, sob a luz da religião, todos esses elementos políticos, econômicos, morais e religiosos de uma supremacia (ou ditadura) papal.

Por "poder" aqui entendo aquele aspecto da faculdade da vontade que quer colocar-se acima dos outros para dominá-los ou física, ou política, ou economicamente, sempre, po­rém, sob o manto da religião.

Noutras palavras: poder, enquanto tal, significa capacidade de dominar. Por isso, neste caso, ideologia do poder é o sonho de domínio que usa da religião para estar acima do bem e do mal, seja político ou eco­nômico.