26/10/2012

O "LIBER PONTIFICALIS" E O PSEUDO-ISIDORO

Nada melhor do que as falsas Decretais do Pseudo-Isidoro para firmar a ideologia do poder eclesiástico romano


Já no século V existia um antigo catálogo dos bispos de Roma: é o "Liber Ponti­ficalis", que na Idade Média era atribuído ao papa Dâmaso (366-384), embora do ponto de vista histórico não se possa fixar-lhe a data.
Este catálogo era também cha­mado "Anastásius", pois alguém começou a lançar a ideia de que teria sido compilado por Anastásio o Bibliotecário (Ro­ma; 815-878), da Igreja roma­na, que foi homem de confian­ça de três papas: Nicolau I, Adriano II, João VIII.
Mas era uma autêntica frau­de, pois tentava impor numa épo­ca de ignorância absoluta, mes­mo entre os eclesiásticos, um documento que encontramos nas suas formas rudimentais no ano de 530.
Veja-se esta obra na edição de Schelstrate, que no seu li­vro "Antiquitas Ecclesiae Romanae" (1693; I; pág. 402, ss) colocou em duas colunas em­parelhadas, de um lado o texto do ano 530 e, ao lado, numa outra coluna, tudo que foi acrescentado nas décadas posteriores, do começo até o ano de 724 com Gregório II  (715-731).
Então aparece em evidência tudo aquilo que foi acrescentado, sem nenhum fundamento his­tórico. É pura manipulação; é pura fantasia, com a finalida­de de mostrar a importância da Igreja de Roma no cenário europeu e asiático.
O livro é escrito num latim deficiente e meio bárbaro que em nada respeita a importantíssima "Conseçutio temporum" dos grandes escritores latinos!
Qual a finalidade deste livro?
Em primeiro lugar era mostrar que os bispos de Roma até então formavam uma cadeia ininterrupta de bispos que, a partir de São Pedro, tinham autoridade sobre a igreja universal.
Em segundo lugar, considerava-se importante crer e fazer crer que a Igreja de Roma teve o maior número de mártires que todas as demais igrejas cristãs. (Sabemos hoje que nem um terço daquilo que está escrito no livro rege a uma pesquisa histórica. Mas, numa época de grande ignorância e fanatismo, isto era importante).
Em terceiro lugar interessava dar caráter histórico a muitas lendas atribuídas a papas e imperadores, como o batismo romano de Constantino.
Em quarto lugar, era necessário apresentar os bispos de Roma como legisladores de todas as igrejas, introduzindo frases como: "aprovou o sínodo tal..."; ou "aprovou o concilio tal..."; etc, embora hoje saibamos muito bem pela pesquisa histórica que esses bispos romanos nunca participaram de sínodos e concilio porque nem eram informados, tão pouco caso se fazia deles!
 
Finalmente, em quinto lugar, apresentar os bispos de Roma como reformadores litúrgicos. (Hoje o mesmo A. G. Martimort na sua fundamental obra "A Igreja em Oração"; trad, portuguesa; Barcelos; 1965; reconhece a falsidade desta tese!).
O "Liber Pontificalis" é uma das mais belas invenções da ideologia do poder dos bispos de Roma. Não tem nenhum fundamento histórico pois os seus autores só sabem afirmar que "papa Dámaso...", "papa Gelásio...", "papa Hilário...", "fecit constitutum de omni ecclesia", isto é: promulgou este decreto para toda a Igreja, o que significou, até aos dias de hoje: para a Igreja universal... Era a tentativa de criar uma situação de fato!
Otto Piper, teólogo presbiteriano, nascido na Alemanha em 1891 e formado em Filosofia e Teologia, entre os vários livros que escreveu, há um que é interessante: "Einleitung ,in,,die monumental Theologie" (Gotha; 1867; pág. 315-349), onde afirma e prova que tudo que o " Liber Pontificalis " contém, não passa de afirmações (sem provas) dos séculos VI e VII.
É como dizer que nada é histórico! Aliás, quase tudo é anti-histórico. É o mesmo que afirmam os críticos Tillemont e Constant depois de um detido exame crítico , do "Liber Pontificalis" afirmando que se torna mais que evidente que os autores deste livro nunca tiveram diante dos olhos algum material histórico em forma de documento.
A única série de papas que aparenta ser historicamente correta é aquela escrita mais ou menos no ano de 536, que vai de Leão I (440) a Félix IV (526); mas esta série é também enfeitada de calculadas invenções romanas.
Mas a Crítica Histórica é uma disciplina moderna. Naquelas antigas épocas de ignorância geral, o "Liber Pontificalis" fez um tremendo sucesso, primeiro porque apresentado pelo papa reinante, isto é: uma autoridade que ninguém ousava discutir, protegida, aliada e amparada pelas armas dos príncipes.
Sabemos pela História que o primeiro a utilizar-se publicamente do "Liber Pontificalis" foi Beda, o "venerável" (Du­rham: 673-735), que escreveu "História Eclesiástica Gentis Anglorum" (História Eclesiástica da nação dos ingleses).
Beda era um erudito meticu­loso que na Europa do Norte go­zava de extrema confiança. No ano 710, escrevendo sobre o cristianismo, utilizou-se do "Liber Pontificalis" e chegou a afirmar que desde a origem do cris­tianismo os bispos de Roma sempre foram os legítimos legisladores da Igreja Universal.
A estima que todos tinham de Beda serviu para calçar as fal­sificações posteriores das Decretais do Pseudo-Isidoro. 
AS DECRETAIS
Isidoro, bispo de Sevilha 601, presidiu o importante Concílio de Toledo em 633. Era considerado o maior erudito do seu tempo, ao ponto de ser proclamado doutor da Igreja. Escreveu “Etymologiae" e outros panfletos que o tornaram conhecidíssimo pelos bispos espanhóis e franceses.
Mais ou menos no VII século, os bispos dos países francos, situados à margem esquerda do Reno, fabricaram uma centena de documentos falsos que afirmavam serem uma coleção de 100 antigas cartas e decretais de vários bispos de Roma e de vários sínodos, que o bispo Isi­doro de Sevilha havia juntado e catalogado.
Lia-se nesses documentos que as Igrejas da Gallia dependiam exclusivamente do bispo de Roma, que detinha o poder eclesiástico absoluto sobre toda cristandade europeia.
A finalidade dessas falsas decretais era verem-se livres dos  metropolitas da região, bem como de príncipes e reis, Esse bispos viriam assim a depender exclusivamente do bispo de Roma (que na época estava a cerca de dois meses de viagem a cavalo...
Quando o bispo de Roma Nicolau I (858-867) soube da existência dessas decretais, apoderou-se delas imediatamente, servindo-se logo, logo, como se fossem documentos autên­ticos que serviam muito bem à ideologia do poder eclesiástico romano.
Com base nestas Decretais do Pseudo-lsidoro, a Igreja de Roma proclamou e fez saber a todas as demais igrejas que ela detinha a pleni­tude do poder eclesiástico.
Em consequência dis­so, todos os decretos sinodais e conciliares de­viam ter a aprovação de Ro­ma antes de entrar em vigor; e, finalmente, todos os bispos eram apenas auxiliares do bispo de Roma," que se tornava automaticamente o bispo da Igreja Universal e o ponto de referência para a fé, liturgia e costumes.
E não era isto que os bispos de Roma queriam, quando idealiza­ram a ideologia do poder? Gregório VII usou e abusou des­tas decretais e, por meio delas, colocou a firme plataforma do poder romano.
Autor: Carlo Bússola, professor aposentado de Filosofia na UFES
 
Fonte: Publicado originalmente no jornal “A Tribuna” – Vitória-ES, numa série sob o título “Os Bispos de Roma e a Ideologia do Poder”.

20/10/2012

A Escolha dos Papas I


O papado era o mais importante e cobiçado cargo da Terra. A família ou a facção que conseguisse eleger o pontífice teria predomínio político e material praticamente sobre todo o mundo. Esta situação prevaleceu durante muitos séculos, quando somente eram eleitos homens poderosos, de famílias da aristocracia e da nobreza. Por esta razão, quase todos os papas, especialmente os que viveram e governaram no período medieval, foram homens devassos, corruptos e cruéis.
A eleição de um papa quase que invariavelmente envolvia intriga, acordos espúrios e interesseiros, pois estava em jogo o cargo mais importante do mundo. Tal fato, não podendo ser desmentido pela Igreja Católica, é por ela justificado como sendo uma prática comum à sua época.
A vida dissoluta e profana dos papas, sua falta de escrúpulos e crueldade, valendo-se de todos os meios para justificar os seus objetivos, principalmente em manter o seu poder e autoridade, recorrendo às vezes até mesmo a crimes e assassinatos, fizeram deles legítimos representantes não de Jesus Cristo, como pretendem, mas de Satanás.
A Bíblia Sagrada, referindo-se à elevação do papado e o seu estabelecimento em Roma, registra este fato, como está escrito: Eu sei as tuas obras e onde habitas, que é onde está o trono de Satanás (Apocalipse 2:13).
A influência e poderio das famílias aristocráticas produziram inúmeros absurdos que Roma hoje procura encobrir, como a eleição de um menino de apenas doze anos, da facção romana dos condes Túsculos, como papa. Este, já mencionado neste estudo, foi o profano papa Benedito IX, que vendeu o papado para outro nobre muito rico, João Graciano, que se tornou o papa Gregório VI.
 
Lourenço, o Magnífico, da família florentina dos Médici que governou Florença por mais de três séculos e que era a família mais rica da Europa, conseguiu que seu filho João de Médici fosse nomeado cardeal em 1.489 com apenas treze anos de idade. Mais tarde este mesmo menino foi escolhido papa, com o nome de Leão X, contemporâneo de Martinho Lutero, cujo pontificado foi marcado pelo cisma provocado pelo referido monge e que ficou conhecida como Reforma Protestante .
 
Um sobrinho de Lourenço, por ele criado e filho bastardo de seu irmão Juliano, também chegou ao trono pontifício em 1.523, com o nome de Clemente VII (Grandes Personagens, p. 89).
 
Como existiam enormes interesses em jogo, ao mesmo tempo em que uma família dominava absoluta, podia ela cair em desgraça pela morte do seu papa, se fosse ele sucedido por alguém de famílias inimigas, o que era bastante comum.
 
Por esta razão estas famílias mantinham grandes exércitos de mercenários. Os condotieri eram chefes de exércitos mercenários, contratados pelas poderosas famílias italianas e pelo papado, para assegurar a posse das cidades livres (Milão, Génova, Veneza, Florença) (Grandes Personagens, p. 98).
 
Segundo a História, Toda personagem poderosa tinha seus soldados, sua corte, seus partidários no Colégio dos Cardeais. Era em armas que se apresentavam no Vaticano (Grandes Personagens, p. 497). Dificilmente, pois, alguém ousaria enfrentar o sumo pontífice: ... afinal, colocar-se contra o papa é criar um inimigo forte, que joga com duas armas poderosas: o sentimento místico do povo e exércitos mercenários muito bem equipados (Grandes Personagens, Lourenço, o Magnífico , p. 424).
 
Outras famílias da aristocracia medieval que conseguiram eleger vários pontífices foram os Orsini, os Della Rovere e os Bórgia. A crónica da família Bórgia se notabilizou especialmente por três personalidades marcantes. Rodrigo Bórgia, que se transformou no incrível papa Alexandre VI e dois de seus filhos, Lucrécia Bórgia, sobejamente conhecida pelos incontáveis escândalos conjugais que protagonizou e César Bórgia, que inspirou o escritor Maquiavel em sua obra-prima O Príncipe. O termo maquiavélico hoje bastante usado e conhecido é derivado das ações e do caráter do temível filho do papa Alexandre VI.
 
Para se ter uma ideia da impiedade e corrupção que imperava nessa época que precedeu à Reforma Protestante, vamos fazer algumas breves considerações a respeito da vida desse papa, do seu antecessor e do seu sucessor, respectivamente os papas Inocêncio VIII e Júlio II.
 
Vamos fazer referência a um registo histórico que menciona o dia em que Rodrigo Bórgia recebeu a tiara papal como Alexandre VI. A grande multidão que ovaciona o novo pontífice, impressionada com a pompa do cortejo papal e a grande festa oferecida para saudá-lo, clama entusiasmada: Roma era grande sob César, hoje é maior. César era um homem, Alexandre VI é um deus, gritam os cidadãos. Muitos, porém, permanecem silenciosos. Para eles, o novo pontífice é um pecador condenado ao inferno (Grandes Personagens da História Universal, p. 493).
 
Ocorre que era por demais conhecida a vida devassa e desregrada do cardeal que agora recebia com o sólio pontifício o título de Sua Santidade. Era ele sobrinho de Afonso Bórgia, o papa Calixto III que o nomeara cardeal em 1.456, juntamente com seu irmão, Pedro Luiz. Para este, foi criado o cargo de Cardeal-sobrinho, depositário do poder temporal do papado .
 
Os excessos do cardeal Rodrigo eram conhecidos, a ponto de ser repreendido pelo papa Pio II, que sucedera a seu tio: O Cardeal Bórgia, porém exagerava, a ponto de Pio II, ter de escrever-lhe, para fazer críticas severas: Querido filho, quando várias senhoras (..) se reuniram nos jardins (..), Vossa dignidade, esquecido do cargo que ocupa, demorou-se junto a elas das 7 às 22 horas. Dançou-se de maneira dissoluta. Ali, nenhum dos prazeres do amor foi esquecido. Os maridos, os irmãos, os pais das jovens senhoras e das moças convidadas não foram admitidos, para que vosso divertimento pudesse ser mais livre de todo obstáculo. Nosso desprazer é indizível. Rodrigo dizia-se arrependido, prometia emendar-se. Ficaria conhecido, porém, como o cardeal que nunca dormia só em seu leito (Grandes Personagens da História Universal, Lucrécia Bórgia , p. 494).
 
Continuam os registros históricos, a respeito do personagem citado: Em 1.468, o irrequieto Cardeal Bórgia tornou-se amante de Giovana Catanei, linda moça de apenas dezasseis anos. Em 1.474, arranjou-lhe um marido cómodo a tempo de que o primeiro filho, César, nascesse em legítimo casamento (Obra citada, p. 494). O cardeal que depois se tornaria papa teve quatro filhos ilegítimos, mas nem por isso escondeu sua paternidade.
 
A respeito deles, diz a História: ... são todos filhos reconhecidos do Cardeal Bórgia, naturalizados espanhóis, e isentos de quaisquer restrições devidas a seu nascimento; a eles estão reservadas inúmeras honrarias. Mas aquela menina loura terá um destino mais amargo. Será dada em casamento em troca de ocasionais alianças políticas e verá seus esposos afastados de si, quando estas alianças perderem a validade. Recebeu a formação de jovem princesa do Renascimento italiano, filha de uma das mais poderosas personalidades da Igreja (Idem, p. 494).
 
Continua a História o registro a respeito da filha do papa, usada como instrumento político pelo pai e pelo irmão César: Onze anos era idade mais que suficiente para uma menina da aristocracia ficar noiva. Lucrécia podia estar orgulhosa da escolha do pai, tanto mais que se dizia que o jovem Dom Gasparo era muito belo. A elevação de Rodrigo Bórgia ao trono pontifício, porém, tornou impossível o casamento. A mão de Lucrécia seria dada em penhor de alianças políticas mais importantes (Idem, p. 497).
 
Vários casamentos foram realizados e anulados, ao sabor dos interesses políticos e de alianças vantajosas. Eis o relato do primeiro: A 12 de junho de 1.493 realiza-se no Vaticano o casamento de Lucrécia Bórgia. Está presente a alta sociedade romana. Sua Santidade tem à esquerda seu filho César, já arcebispo de Valência. João Bórgia, duque de Gândia, acompanha a irmã. Após a cerimónia, as festividades. Escudeiros da Casa do Cardeal Colonna, vestidos com peles à maneira de selvagens, recitam poemas sobre o amor. Camaristas servem doces, frutas e vinhos. Enorme quantidade de confeitos é atirada ao povo. Mais tarde, no salão dos pontífices, Alexandre VI oferece aos convidados esplêndida recepção, com danças e teatro. À noite, o papa conduz pessoalmente o casal ao Palácio de San ta Maria in Pórtico, residência de Lucrécia. É esta a primeira alusão a relações incestuosas entre Lucrécia e seu pai (Ibidem).
 
Alexandre VI protagonizou várias tragédias mas a mais dolorosa foi a morte do filho que mais amava, o Cardeal João Bórgia, assassinado pelo irmão César, segundo as crónicas da época: ... quando Alexandre conseguiu superar a dor (depois de permanecer dois dias trancado em seus aposentos, chorando o tempo todo pela morte do filho João Bórgia), reuniu os cardeais. Diante deles atribuiu a morte do filho a um castigo divino, pelos muitos pecados do pai. Ninguém sabia quem fora o assassino. Falava-se nos Orsini, no senhor de Pesaro. Aos poucos, um nome destacou-se dos demais o de César Bórgia. Alexandre, alquebrado pelo desgosto, deixou -se dominar pelo Cardeal de Valença. César tornou-se cardeal leigo: poderia casar, perpetuar a Casa dos Bórgia com uma aliança política vantajosa. Pelas mesmas razões, era preciso anular o matrimónio de Lucrécia. Como seu casamento ficara estéril, o papa decidiu que não tinha sido consumado. Sforza foi considerado impotente e frio por natureza. Ela, depois de rir muito, cedeu aos desejos familiares e confirmou as acusações (Idem, p. 503).
 
Os escândalos envolvendo a família do papa continuavam a acontecer numa sucessão espantosa: Em fevereiro de 1.498, novo escândalo abala a sociedade romana: Pedro Calderón, camareiro do papa, é encontrado morto no Tibre. Imediatamente começam os rumores. O embaixador veneziano informa que César teria assassinado o jovem camareiro no próprio Vaticano, diante de Alexandre; Calderón teria morrido por ser amante de Lucrécia, que esperava um filho dele. César assassinou o rival, dizem os inimigos dos Bórgia (Ibidem).
 
O livro católico das crónicas papais assim se refere a Alexandre VI: Rodrigo Bórgia, espanhol de Valença, sobrinho de Calisto III, eleito na capela Sistina adoptou o nome de Alexandre VI. Era de grandes dotes naturais. O seu passado, porém, não o recomendava. Militar, aventureiro, possuído pela vida mundana, quatro filhos crescidos na depravação geral de uma época em que, com as artes, renascera o paganismo e na qual tudo o que era belo era considerado bom! Turvam a vida de Alexandre VI os atos de seus filhos: César Bórgia, a quem o papa amava e temia, foi herói do Príncipe de Maquiavel, impôs a sua férrea e traiçoeira política aos barões italianos, tornando odioso o nome paterno e Lucrécia Bórgia, vilmente caluniada, que foi exemplar esposa como duquesa de Ferrara. Pelos Arquivos Secretos do Vaticano, destemidamente franqueados aos estudiosos por Leão XIII, vê-se que Alexandre VI errou como homem (S. Pedro negou três vezes a Cristo), errou como príncipe (o meu reino não é deste mundo), jamais, porém errou nos ensinamentos da Igreja como Papa, Vigário de Cristo, o qual Cristo, dormindo na Barca de Pedro, sustentava-a contra as tempestades da Renascença paganizante e a favor de homens de pouca fé (Biografias dos Papas, p. 437).
 
Segundo o mesmo livro Biografias dos Papas, p. 435, João Batista Cibo chamou-se Inocêncio VIII. Foi eleito por cardeais impregnados do espírito da época: em sua maioria eram leigos e mundanos, quase sempre representantes de reis ou de famílias nobres, alheios, portanto, ao bem da Igreja. Comprometeu-se pois, Inocêncio, antecipadamente com seus eleitores o que lhe trouxe a pecha de simonia. Inocêncio era douto, humilde e bondoso, foi porém condescendente demais com seus filhos e sobrinhos. Para atrair Lourenço de Médici, o Magnífico, de Florença, nomeou cardeal seu filho João de Médici, o futuro Leão X, jovem demais. Como todos os príncipes de seu tempo, Inocêncio primou em estimular a artistas e literatos .
 
O papa Júlio II foi quem realmente sucedeu a Alexandre VI, porquanto Pio III não completou sequer um mês de pontificado. Da família Della Rovere, de muitos papas, Juliano Della Rovere era sobrinho do papa Sisto IV. Incrementou a cultura e as artes. Roma tornou-se a capital artística do mundo: Miguel Ângelo, Rafael, Bramante, a quem confiou a construção da nova basílica de S. Pedro, são nomes que imortalizaram o pontificado de Júlio II. Mais príncipe que papa, foi o homem necessário à salvação do pontificado numa época de prepotência (Biografias dos Papas, p. 441, destaques acrescentados).
 
Se conforme o registro abaixo, a respeito do caráter dos sobrinhos do papa Sisto IV apenas Júlio II se mostrou digno, como não terão sido os outros sobrinhos-cardeais? Pois eis o que a História declara do papa Júlio II: Júlio II foi considerado uma das figuras mais profanas que já passaram pelo trono de São Pedro (Grandes Personagens da História Universal, p. 108).
 
Se em todos os aspectos o pontificado do papa Alexandre VI foi abominável, o seu sucessor em nada ficou atrás na prática da corrupção e comportamento devasso. Júlio II, ao assumir o papado revelou, em nome da verdade, como pretexto, a grande iniqüidade do seu antecessor, revelações estas que na verdade tiveram por motivação o ódio pessoal e a rivalidade de suas famílias e facções políticas, para inviabilizar suas articulações visando a reconquista do poder. Segundo a História, O pontificado de Júlio II imitaria em tudo a obra de seu odiado inimigo Alexandre VI (Grandes Personagens, p. 508).
 
O tio de Júlio II, O papa Sisto IV, Francisco Della Rovere foi eleito num rápido conclave. Favoreceu o nepotismo; nomeou cardeais e príncipes a muitos sobrinhos seus, dos quais apenas um, o futuro Júlio II, mostrou-se digno. Excluindo-se sua fraqueza ante a deplorável vida de seus sobrinhos, Sisto IV realizou esplêndido governo. Construiu a magnífica e celebrada Capela Sistina. Seu nome está ligado à Inquisição espanhola, a qual infelizmente foi usada por civis para fins políticos ou por ignorância e fanatismo da época, ocasionando reprováveis abusos. A Sisto IV erigiram um sepulcro monumental. Nele, porém, figuram apenas motivos das artes e das ciências, nada de sinais cristãos! (CORREA, Iran (Padre), Biografias dos Papas, S. D. B., p. 433).
 
Note-se que esta obra católica é destinada a enaltecer a obra dos papas, expor a sua biografia, chamando-os de Guardiães Vigilantes dos Textos Sagrados Através dos Séculos . A introdução do livro finaliza com estas palavras: Abençoe a Virgem Santíssima Auxiliadora estas páginas: possam elas tornar mais conhecido e amado o sucessor de S. Pedro, o Vigário de Jesus Cristo na Terra, o Santo Padre, o Papa! (p. 11).
 
Se a obra destinada a enaltecer a vida destes papas deixa entrever o seu caráter mundano e ímpio, imagine-se como terá, na realidade, sido a vida destes inimigos de Deus e da verdadeira religião!
 
João de Médici, o filho de Lourenço, o Magnífico, sucedeu a Júlio II, com o nome de Leão X. Foi ele o papa contemporâneo da Reforma de Martinho Lutero. A seu respeito o livro Biografias dos Papas, já mencionado, traz o seguinte comentário: Na História da Igreja, em Leão X, os fulgores do príncipe foram fatais ao Pontífice (p. 443). Eis um interessante registro a respeito do referido pontífice: Finalmente chega a paz, depois da morte de Júlio II. Sobe ao trono dos pontífices Leão X, da Casa dos Médici. É o poderoso senhor de uma Itália exausta e empobrecida, vulnerável aos ataques da França e do Sacro Império (Grandes Personagens, p. 508).
 

Bonifácio III é nomeado Bispo Universal

O título de Bispo Universal foi criação do imperador grego Focas; não de Jesus Cristo


Depois de 12 meses de sangrentas lutas durante a vacância da Sé pontifícia, quando várias facções romanas queriam que fosse nomeado bispo seu eleito, venceu o partido e Bonifácio, que então foi ordenado e recebeu o nome de Bonifácio III.

 
Dizem os historiadores que Bonifácio ganhou a vaga porque o imperador Focas gostava dele desde a época em que vivia na corte de Constantinopla. Focas havia matado sua mulher, a imperatriz, e suas filhas e o patriarca Ciríaco o havia excomungado.

Para vingar-se, Focas elevou a Sé de Roma acima da Sé de Constantinopla, dando ao papa o título de Bispo Universal de todas as igrejas cristãs.


Parêntese: primeiro, até esta época (607 d.C) a Sé de Roma, embora patriarcado, era considerada, na prática, inferior à Sé de Constantinopla por ser esta a nova capital do império romano que ainda existia pelo menos de nome.


Segundo: ainda não existia o título de honra de "Bispo Universal". Terceiro: este título, com tudo aquilo que implica o adjetivo "universal", foi criação do imperador Focas, c não de Jesus Cristo! É bom frisar isto.


Mas Bonifácio III gostou tanto do título que convocou logo um sínodo com todos os bispos do seu patriarcado para cientificá-los da nova situação religiosa da Sé de Roma e para que, a partir de então, todos os bispos só pudessem tomar posse depois do reconhecimento do bispo de Roma. Mas morreu nove meses depois da sua eleição,em l2de novembro de 607.

Sucedeu-lhe Bonifácio IV (608-615), que agradeceu o imperador Focas pelo que havia feito à Sé de Roma. Focas, enternecido, deu-lhe de presente o templo do Panteon construído por Mário Agripa, genro de Augusto, 30 anos antes da era cristã e consagrado a todos os deuses do paganismo.


Sucedeu-lhe Deodato (615-618): um homem piedoso que só viveu

para ajudar os leprosos, que eram numerosos em Roma. Morreu abençoado por todos.


Sucedeu-lhe Bonifácio V (619-625) e, a este, Honório (625-638), que representa um verdadeiro problema para a Igreja Católica. Com efeito, o bispo Honório é a clássica prova, nas mãos dos racionalistas, de que o papa não é infalível (como define o dogma católico) porque sustentou e aprovou a heresia monotelista, professada na igreja grega e protegido pelo imperador Heráclio.

Os monotelistas sustentavam que Jesus tinha uma só vontade: a vontade divina e não tinha vontade humana. Num sucessivo concilio, em 649, os bispos condenaram o monotelismo e condenaram também o papa Honório queimando suas cartas e gritando: "Excomungado seja Honório, o herético!"


Seguiu-se mais um concilio ecumênico condenando o monotelísmo e o papa Honório. As histórias dos papas escritas por católicos dizem somente que "se deixou enganar pelo patriarca Sérgio". Outros católicos escrevem: "manifestou-se sobre o monotelismo de maneira que mais tarde será criticado...". Esconde-se a triste verdade!

Sucedeu-lhe Severino (640) e logo em seguida João IV (640-642) e Teodoro I (642-649). Este bispo era um homem particularmente rancoroso e vingativo, dando prova de grande intolerância nas disputas teológicas do monotelismo.

 
Conta a história que querendo ele nu-milhar o bispo Pirro, que já foi monotelista, mas então, depois da retratação vivia retirado em Rovena, Teodoro reuniu em Roma um grupo de bispos e em seguida, misturando tinta vermelha com o vinho da missa já consagrado (o sangue de Cristo na crença católica) assinou com essa mistura a condenação de Pirro.


Historiadores católicos não tocam neste episódio ou quando tocam, dizem que este é um uso particular dos prelados gregos e já que Teodoro era filho de um patriarca de Jerusalém, queria continuar a tradição oriental...


Sucedeu-lhe Martinho I (649-655) que deu continuidade aos debates ocasionados pelo monotelismo. A pedido de vários bispos mandou reunir no palácio do Latrão um concilio de 500 bispos para que examinassem as questões religiosas que perturbavam a Igreja.


O concilio durou muitos meses e teve cinco sessões, a primeira das quais começou em 5 de outubro de 649. Todos os bispos falaram e falaram muito; mas poucos eram aqueles que diziam coisas certas, por falta de estudos teológicos e sobretudo por falta de idéias filosóficas.


O historiador Sócrates Escolástico, referindo-se aos bispos desta época diz claramente que eram "simplórios e ignorantes". (Bastaria só a pergunta: o que significa "vontade de Deus", se Deus não pode ter vontade porque a vontade é um atributo humano?)


Mas por fim, muito entediados e cansados aprovaram por contagem de votos, 20 cânones; e condenaram um monte de gente que não pensava como eles.


O fim de Martinho I [Papa] foi extremamente triste. Levado prisioneiro a Constantinopla por ordem do imperador, sofreu por muitos meses uma dolorosa prisão. No fím, quase morto, sem poder se defender, foi desterrado para o Quersoneso, onde morreu de fome aos 16 de setembro de 655. Isto para que os bispos de Roma aprendessem que quem ainda mandava na Itália e na Igreja era o imperador.

Sucedeu-lhe Eugênio I (654-657), de cuja santidade todos os historiadores são pródigos. Sabe-se que fez tudo que lhe era possível para reconciliar a Igreja com o imperador.


Sucedeu-lhe Vitaliano (657-672), que continuou a política de seu predecessor. Aliás, conseguiu do imperador um decreto que colocava o bispo Mauro de Rovena sob o poder do bispo de Roma.


IGNORÂNCIA

A impressão que se tem pesquisando em diferentes autores a história desses papas é a enorme, infinita ignorância teológica e filosófica. O papa tal tem uma intuição meio estranha?!?... Pronto! Declara que aquilo é artigo de fé.


Como não existia mais nenhuma Escola de Filosofia (Justiniano fechou a última!) ninguém era treinado no raciocínio lógico. Tudo é fundamentado na fé. Aliás, tudo é baseado naquilo que lreneu disse...; que Epifânio disse.../ que Agostinho disse.../ etc. etc.

É nos "disse que disse" que, nesta época, se constroem as grandes verdades do cristianismo. A ninguém interessa saber o que Jesus disse, porque, de fato, Jesus nada escreveu e certamente pouco se importasse com as teologias...

Quando os legatos pontifícios de papa Agaton chegaram a Bizân-cio, o imperador Constantino recebeu-os no oratório de São Pedro, no palácio imperial.


Eles apresentaram-lhe as cartas da cúria romana e grande foi a surpresa do monarca quando por um primeiro exame, reconheceu a extrema ignorância dos padres da igreja latina que escreviam numa língua latina cheia de erros! Erros de ortografia! Erros de palavras! Erros teológicos!

Mas os padres da igreja grega não eram melhores. Nem estes nem aqueles tinham idéias claras sobre a pessoa de Jesus; sobre a Trindade; sobre o conceito de Deus (considerado uma pessoa muito especial, lá no alto dos céus); sobre a Virgem Maria...


Nos sínodos e nos concílios prevalecia a opinião do bispo mais poderoso e os demais levantavam o braço num obsequioso consentimento... (Parêntese: até no Concilio Vaticano II os bispos tinham seus "Periti", ou seja, os teólogos que conheciam a Teologia!!!).


Resumindo: desde a morte de Jesus, passaram-se sete ou oito séculos de cristianismo: um cristianismo cheio de disputas teológicas que, naturalmente, não levaram a nada.


E assim o nosso cristianismo atual é um conjunto artificial de idéias prováveis, ou, melhor, de suposições que o fanatismo de cada época acrescentava como sendo verdades certas, mas que quase sempre eram impostas pelas armas dos reis e mais tarde pela Inquisição e foram aceitas pela força de tradição.


Dá para entender por que o falecido cardeal Otaviani, prefeito do antigo Santo Ofício (da Inquisição) a toda hora nos dizia a nós estudantes de Teologia: "A nossa fé é baseada na tradição... Aliás, é a tradição que nos dá as Sagradas Escrituras".


Podia também dizer: "É a tradição que garante o poder eclesiástico".

 
Autor: Carlo Bússola, professor aposentado de Filosofia da UFES


Fonte: Publicado originalmente no jornal “A Tribuna” – Vitória-ES, numa série sob o título “Os Bispos de Roma e a Ideologia do Poder”.

Nota e Comentários do IASD Em Foco

Temos aqui, na postagem destes excelentes artigos, enfatizado reiteradamente a erudição, imparcialidade e honestidade intelectual do Dr. Carlo Bússola. Tudo o que ele escreve aqui em termos de História e a “ideologia de poder dos bispos” é fidedigno... Ocorre, porém, que, sem má fé ou distorção da verdade, o pesquisador comete um equívoco – ainda que parcial – quando faz as seguintes colocações:


É nos "disse que disse" que, nesta época, se constroem as grandes verdades do cristianismo.

E assim o nosso cristianismo atual é um conjunto artificial de idéias prováveis, ou, melhor, de suposições que o fanatismo de cada época acrescentava como sendo verdades certas, mas que quase sempre eram impostas pelas armas dos reis e mais tarde pela Inquisição e foram aceitas pela força de tradição.


"A nossa fé é baseada na tradição... Aliás, é a tradição que nos dá as Sagradas Escrituras".


Por mais que doa esta verdade aos católicos sinceros – e eles existem aos milhões – isso não se aplica ao Cristianismo como um todo, mas, sim, à Igreja Católica Apostólica Romana. Este poder que – como estava profetizado centenas de anos antes – nas suas duas fases (imperial e papal) substituiria a Verdade da Palavra de Deus pelas mentiras das tradições humanas.

Vejamos, de forma sucinta, o que diz a Bíblia sobre isso:

“De um dos chifres saiu um chifre pequeno e se tornou muito forte para o sul, para o oriente e para a terra gloriosa. Cresceu até atingir o exército dos céus; a alguns do exército e das estrelas lançou por terra e os pisou. Sim, engrandeceu-se até ao príncipe do exército; dele tirou o sacrifício diário e o lugar do seu santuário foi deitado abaixo. O exército lhe foi entregue, com o sacrifício diário, por causa das transgressões; e deitou por terra a verdade; e o que fez prosperou” (Daniel 8:9-12).

Foi Roma, repetimos e provamos bíblica e profeticamente, que nas suas duas fases – imperial e papal – atacou todo o conjunto de verdades bíblicas e o jogou por terra. É o quarto animal de Daniel 7 (ler: Daniel 7:7) exatamente o quarto Império Mundial e, das suas cinzas, surge um poder (Roma papal) simbolizado pelo “chifre pequeno” ou “ponta pequena” (ler: Daniel 7:8, Apocalipse 13:1-10).


Nosso Senhor Jesus e profetas e escritores bíblicos já haviam advertido sobre o gravíssimo perigo de substituir a Palavra de Deus pelas tradições humanas:

 
“Ele, porém, lhes respondeu: Por que transgredis vós o Mandamento de Deus, por causa da vossa tradição? [...] E, assim, invalidastes a Palavra de Deus, por causa da vossa tradição” (Mateus 15:3 e 6).

“Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está longe de Mim. E em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens” (Mateus 15:8-9).


“E em vão Me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens. Negligenciando o mandamento de Deus, guardais a tradição dos homens. E disse-lhes ainda: Jeitosamente [com astúcia, falsificações da verdade, embustes, enganos de toda sorte] rejeitais o preceito de Deus para guardardes a vossa própria tradição” (Marcos 7:7-9).

 
Cuidado que ninguém vos venha a enredar com sua filosofia [os padres dão show de filosofia: Tenho amigos que estudaram em seminários católicos e, hoje, são padres. Com eles é assim: Filosofia 10 X Bíblia 0] e vãs sutilezas, conforme a tradição dos homens, conforme os rudimentos do mundo e não segundo Cristo” (Colossenses 2:8).

Quando entram em campo questões religiosas, espirituais, questões de salvação: das quais dependem o nosso destino terno, é bom lembrar sempre que:


- O importante não é o que o presbítero diz!

- O importante não é o que o missionário diz!

- O importante não é o que o evangelista diz!

- O importante não é o que o bispo diz!

- O importante não é o que o obreiro diz!

- O importante não é o que o “apóstolo” diz!

- O importante não é o que o padre diz!

- O importante não é o que o pastor diz!*

- O importante não é o que o teólogo diz!

O importante é o que Deus diz!!! O importante, e nisto está a nossa segurança eterna, é o que a Palavra de Deus diz!!! E ela nos ordena:

“Retirai-vos dela, povo Meu, para não serdes cúmplices em seus pecados e para não participardes dos seus flagelos” (Apocalipse 18:4).

Ela nos indica para onde devemos ir e que caminho devemos seguir, em meio aos enganos finais dos últimos dias:

“Aqui está a perseverança dos santos, os que guardam os Mandamentos de Deus e a fé em Jesus” (Apocalipse 14:12).

* Digo isso na condição acadêmica e espiritual de quem cursou 3 faculdades (reconhecidas pelo MEC, incluindo Teologia) e uma Pós-Graduação em Ciências da Religião. Nesse caso não importa títulos ou formação acadêmica: o que importa é o conhecimento da Palavra de Deus – deixar Deus falar e o Espírito Santo agir...
 

16/10/2012

A Escolha dos Papas II

A palavra heresia é definida como doutrina contrária ao que foi definido pela Igreja em matéria de fé (Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 28 ed). Entretanto, no período de intolerância religiosa e perseguições do período medieval em que foram assassinadas centenas de milhares de pessoas acusadas de heresia, esta palavra tinha um significado diferente.

João Hus na praça de Praga, lugar onde
foi queimado, perto fica a igreja
onde pregava.

Heresia era tudo que contrariasse a menor das imposições de Roma. E os hereges eram perseguidos e condenados à morte, geralmente na fogueira, depois das mais cruéis e ultrajantes torturas. O grande absurdo que causa assombro é que o mais herege de todos os poderes jamais manifestado no mundo em todas as épocas persegue os Santos do Altíssimo, acusando-os de hereges, em nome de Deus.
Eis alguns dos hereges: João Huss, Wicliff, Zwinglio, Pedro Valdo, Lutero etc. Todos estes eram homens simples e piedosos, cuja heresia se constituía em contestar a autoridade papal, condenando o luxo e a corrupção dos costumes e desejando o retorno à simplicidade dos tempos apostólicos e dos ensinamentos de Jesus, tendo a Bíblia Sagrada como única norma de fé.
A história dá testemunho de alguns dos que lideraram esses movimentos. Dentre estes destacaremos alguns, que a Igreja de Roma perseguiu como heréticos, destacando em primeiro lugar a João Huss: Segundo a história, João Huss vivia na pobreza e na admiração de seu povo... (Grandes Personagens da História Universal, p. 383). Na Boémia, e em todos os eleitorados do império, a Igreja era extremamente rica. Havia três eleitorados eclesiásticos, isto é, seus príncipes eram bispos. Conventos e bispados, afora as regalias de que gozavam como a isenção de taxas e outros benefícios , possuíam um terço da terra arável e grande riqueza em ouro e construções. Toda essa riqueza e poderio da Igreja eram normais e típicos de um Estado feudal. Mas não deixavam de criar problemas. Por toda a Europa, emergiam movimentos heréticos não reconhecidos pela Santa Sé; pregavam a volta ao Cristianismo primitivo, à pobreza dos apóstolos, que viviam só para Deus.
Pregavam contra a venda das indulgências, pois ... o dinheiro obtido com a venda de indulgências aos cristãos serviria para financiar uma nova cruzada da Igreja e enriquecer ainda mais alguns bispos que se haviam afastado da verdadeira doutrina pregada por Cristo (Ibidem). Os hereges pregavam que bispos e monges deviam abandonar os direitos feudais, dividir os haveres entre os pobres e viver como os apóstolos, trabalhando e propagando a fé (Idem, p. 384). Huss recusa-se a aceitar o princípio de que o papa é a cabeça da Igreja (Idem, p. 391).
Por esta razão o herói da fé foi perseguido pelo poder papal. Intimado a apresentar-se diante de um tribunal da Igreja para defender-se, apresentando suas razões, foi aconselhado a não comparecer. O Imperador Sigismundo, entretanto, sob juramento deu-lhe um salvo-conduto, assegurando-lhe a vida e a segurança. Sigismundo, concedendo salvo-conduto a João Huss, para ir defender no Concílio de Constança sua posição, permitiu, contudo, que fosse queimado vivo (Grandes Personagens, p. 92).
João Huss, amarrado à fogueira, foi conclamado a abjurar a sua fé, se não quisesse morrer queimado. Mantendo-se fiel, morreu como herói e mártir, cantando hinos de louvor a Deus e dando exemplo de como se porta um Santo do Altíssimo, quando defrontado com a morte. Como prémio pela sua indignidade o imperador foi agraciado pelo papa como um benfeitor da Igreja. Diz a História: ... o novo papa recebeu o nome de Martinho V. Sigismundo, (o perjuro) mereceu do novo pontífice a Rosa de Ouro, a maior condecoração da monarquia vaticana (Idem, p. 391).
Outro pregador das verdades bíblicas e que sacudiu a opinião pública sobre os desmandos do papado foi Wiclif Mestre em Oxford e famoso pregador, condensou em sua doutrina toda a indignação dos católicos ingleses contra a riqueza e a corrupção do papado. Escreveu várias obras negando a ascendência papal sobre os reis, propondo o confisco dos bens da Igreja pelo Estado e invalidando a hierarquia católica. Pregava o retorno à pobreza e o livre acesso dos fiéis a Deus, mediante as Escrituras. Denunciou o comércio de indulgências perdão dos pecados em troca de dinheiro para a Igreja e desacreditou o culto aos santos e à peregrinação. Contemporâneo do Grande Cisma (quando mais de um papa se proclamou chefe da Igreja), Wiclif desafiou o clero até o fim da vida. Suas doutrinas foram condenadas como heréticas pelo papa Gregório XII (Grandes Personagens, p. 91).
Nessa época a religião havia perdido todo o sentido e semelhança com a religião de Cristo e dos apóstolos, ensinada pela Bíblia Sagrada, que estava escondida do povo. Sua leitura fora proibida pelo Concílio de Valença, desde 1.229, quando foi colocada no índice dos livros proibidos. A ignorância é tão profunda entre o povo, a religião tão envolta em superstições... O próprio papa Leão X, sentia-se mais à vontade entre artistas e cortesãos do que ao lado de teólogos... (Grandes Personagens, Erasmo , p. 470).
Os movimentos de oposição aos abusos papais aumentavam: Na Inglaterra, Henrique VIII proclama-se chefe supremo da Igreja inglesa, que passa a se denominar Anglicana . O aprofundamento do estudo dos textos bíblicos contribuiria para a realização da Reforma Protestante. (Erasmo , p. 476).
O mais eficaz e expressivo de todos os movimentos surgiu na Alemanha, aumentando a preocupação e as perseguições do clero: Outro problema extremamente grave vinha juntar-se à lista: tomava corpo, na Alemanha, uma heresia religiosa conhecida pelo nome de Reforma. Propagada por um monge chamado Lutero, a nova doutrina pregava um culto mais simples, revoltava-se contra a vida de luxo de alguns setores do clero, contestava a autoridade do papa ( Carlos V , p. 581). Não era apenas o aspecto espiritual que preocupava a Igreja: com a Reforma, perdera muitas propriedades e deixara de recolher impostos ( Galileu , p. 657). Ulrich Zwinglio pregava o abandono de todo ritual. A fé individual deveria ser incentivada sem símbolos ( Lucrécia Bórgia , p. 119).
Semelhante aos movimentos reformadores surge próximo a Roma um pregador, Francisco de Assis, que não foi perseguido e nem teve o mesmo destino dos chamados heréticos. É que por estar próximo à Roma foi ele controlado pela hierarquia vaticana: 1.208 O papado está no auge de seu poder temporal: Espanha e Portugal são Estados vassalos da Igreja. Francisco neste mesmo ano, faz voto de pobreza e começa a pregar sua doutrina. Acompanhado dos primeiros discípulos, pede autorização ao papa para fundar uma nova irmandade mendicante. Preferindo isto a vê-los cair na heresia, Inocêncio III acede verbalmente à solicitação (São Francisco, p. 304).
 
1.215 No intuito de resguardar a autoridade papal, o Concílio de Latrão reconhece a Ordem dos Franciscanos. Inocêncio espera utilizá-la a serviço de seus próprios interesses (Ibidem). A vida de Francisco de Assis é em tudo semelhante à de Pierre Valdo, pregador considerado herético por Roma. A doutrina que pregam é a mesma. A única diferença entre os dois é que o primeiro, mais próximo de Roma, foi por ela controlado e serviu aos seus propósitos.
O segundo foi condenado como herege porque não aceitava a corrupção papal. Assim registra a História: Um rico burguês de Lyon, Pierre Valdo, distribuiu todos os seus bens entre os pobres e tomou o caminho do apostolado e da pregação errante. Com o Novo Testamento traduzido para a língua provençal, seus discípulos percorriam a Europa. A iniciativa dos pobres de Lyon como eram chamados os valdenses, muito semelhante à de São Francisco de Assis, contrariou o papado, porque fugiu ao controle eclesiástico; foi perseguido pelo Concílio de Verona (Grandes Personagens da História Universal, p. 71).
Francisco refletia sobre a vida que levava antes de sua conversão: Como pude gozar tanto de riqueza, enquanto os miseráveis erram pelas estradas à cata de um pedaço de pão? Como pode haver tanta injustiça, tanto luxo, ao lado de tanta pobreza? (Grandes Personagens, São Francisco , p. 306).
A vida luxuosa do clero deixava-o cheio de perplexidade: Francisco ouve e medita. Então é isto... diz em voz baixa, Cristo também desprezava as riquezas e pregava a Seus apóstolos uma vida simples, sem nenhum artifício material! Mas a Igreja e os prelados de hoje não parecem apreciar muito este preceito (São Francisco , pp. 308 e 311). Como a vida de Jesus era diferente da vida dos papas! reflete ele. De um lado, a maior humildade; de outro, a maior das opulências! a Igreja se desviou incrivelmente dos ensinos do Cristo . Em toda parte começam a surgir reações a este tipo de coisas. Monges, isoladamente, ou mesmo algumas confrarias, resolvem corrigir os abusos e fazer voltar a igreja à austeridade e às práticas espirituais. Insurgem-se contra a doutrina teocrática, pela qual o papa pretende ser o soberano do mundo. Pregam a volta à simplicidade do Evangelho. Assim, os valdenses, ou pobres de Lyon , pretendem despojar a Igreja das riquezas terrenas . Inocêncio bem podia consentir certas reformas, cedendo às súplicas dos monges, mas que não se tocasse em seu poder, sobretudo político! As seitas reformadoras são logo qualificadas de heréticas e seus componentes perseguidos impiedosamente. Ele próprio (Francisco) dava exemplo do que pregava... Queria uma religião pura, sem instituições ou hierarquia, para não cair nos mesmos erros do clero. A Igreja enfrentava, na ocasião, o difícil desafio das seitas heréticas valdenses, cátaros, pataros, na França meridional e na Itália se tentrional , monges que levavam uma vida simples, e criticavam asperamente a dissolução de costumes no seio da igreja oficial (Idem, p. 311).
A História reconhece a distância existente entre o que a Igreja de Roma vivia e o que ela ensinava, numa época em que são visíveis os contrastes entre a teoria e a prática da Igreja (Idem, p. 312). Inocêncio já compreendera que um movimento dessa importância, fora da Igreja, poderia constituir um perigo; dentro dela, e bem tutelado, poderia servir admiravelmente a seus objetivos (Idem, p. 315). A partir de então, a ordem expandiu-se consideravelmente. Não exatamente no sentido que desejara o fundador, mas como instrumento do poder papal (Idem, p. 316).
A venda de indulgências foi a principal causa da reforma protestante. O flagrante absurdo promovido pelo papado na busca desenfreada de dinheiro, vendendo a quem pudesse pagar um lugar no paraíso revoltou algumas poucas pessoas que tiveram acesso às verdades das Escrituras e o conhecimento de que a salvação é de graça e se obtém pela fé.
Uma dessas pessoas foi o monge Martinho Lutero, que se escandalizou ao viajar para a cidade dos césares e dos papas: A Roma que Lutero conheceu, em fins de 1.510, não era mais a cidade dos mártires, o centro espiritual da Europa Cristã. É uma cidade governada por papas desejosos de estender o seu domínio sobre as regiões vizinhas. Para isso utilizam todas as armas, desde a excomunhão até os venenos: abençoam os exércitos dos reis europeus que ensanguentam o solo italiano. O papa Júlio II não se contenta em fazer a guerra: ele a comanda em pessoa, vestido de armadura e capacete. Bispados e dioceses estão à venda. Seus titulares, grandes senhores da nobreza, vivem na corte pontifícia, em meio a intrigas e galanterias. Nos locais de peregrinação e nas igrejas as prostitutas fazem seu comércio . No entanto, a venda de sacramentos era apenas um aspecto secundário, fruto da ignorância do clero da época. Muito mais grave era a venda das indulgências, destinadas a assegurar o perdão às almas do Purgatório . No fim do século XV, a Igreja havia afirmado solenemente a eficácia das indulgências. Prometia-se aos vivos a redução das penalidades futuras no Purgatório. Para os mortos, porém, era a salvação: bastava saber a soma completa dos pecados de alguém e comprar a indulgência correspondente. Algumas bulas pontifícias, mais tarde, ofereciam não só a redução das penas, mas a completa remissão dos pecados. Asseguravam a quem tivesse dinheiro suficiente, a total reconciliação com Deus, a entrada direta no Paraíso. Durante muito tempo as populações do Ocidente medieval acreditaram que poderiam comprar a salvação acumulando relíquias e indulgências em troca de uma esmola. Interessada na difusão do culto dos santos, a Igreja associou a veneração das relíquias com o comércio das indulgências . Cada uma destas relíquias representavam séculos de indulgências (Grandes Personagens da História Universal, p. 529).
Contra este estado de coisas insurgiu-se o padre católico Martinho Lutero: Os sacramentos distribuidores da graça perderão para ele toda a importância. Assume seu lugar a iluminação interior. O diálogo entre Deus e o crente vem substituir a liturgia e os sacramentos, vem substituir a longa cadeia de intermediários entre os cristãos e o seu salvador (Idem, p. 530). Unicamente a fé e não as obras, sobretudo as feitas em troca de dinheiro. Aquele que se julga salvo por ter comprado indulgências se refugia numa falsa segurança . O ponto central dos ataques era a própria concepção de comércio de indulgências: Lutero negava o poder do papa sobre o Purgatório, não vendo na hierarquia eclesiástica autoridade suficiente para apagar as penas decorrentes dos pecados. Se o papa tem o poder de livrar alguém do purgatório, por que então, em nome do amor, ele não extingue o próprio Purgatório? No Evangelho, único tesouro do cristão, não existe uma só palavra sobre essa capacidade de perdão pela compra de relíquias (Idem, p. 531).

03/10/2012

Começo do Poder Eclesiástico



O bispo de Roma Leão Magno foi o primeiro que falou no direito que os bispos têm de mandar nos cristãos 

Desde o começo, os apóstolos estabeleceram auxiliares. Assim nos informa Clemente Romano. Estes auxiliares eram chamados "episcopói" ou ''presbiterói". Também as cartas de Inácio de Antioquia (100-115) dizem a mesma coisa, talvez repetindo Clemente...Também Cipriano, bispo de Cartago, repete Clemente.

Para todos, porém, é coisa evidente que os bispos são autónomos em suas assembleias (Igrejas); "quando muito, comunicam-se uns com os outros mediante cartas exortatórias ou doutrinais, ou simplesmente pedindo esclarecimentos.

Assim Clemente de Roma escreve ao bispo de Corinto; assim Dionísio, bispo de Corinto, escreve ao bispo de Roma... Surge, aos poucos, para facilitar as consultas entre si, o cargo dos metropolitanos, cujas sedes são: Antioquia, Cesareia, Jerusalém, Alexandria e Roma.

Os bispos que pertencem a uma sé metropolitana, vez ou outra se reúnem em sínodos para confrontarem suas ideias, ou para julgarem as ideias de algum cristão que pensa diferente (herege), ou para solucionar casos duvidosos.

Só com o concilio de Nicéia, em 325, é que a coisa toma vulto oficial e imperial... Notamos aqui, de passagem, que os primeiros nove concílios se realizaram todos no Oriente e os bispos de Roma não estiveram presentes em nenhum deles, tão insignificante era a igreja de Roma!

Foi a partir do século V que os bispos de Roma tentaram reservar-se o poder de confirmar as conclusões destes concílios, baseando-se no fato de serem bispos da antiga capital do mundo. Veremos isto mais à frente.

Voltemos agora ao bispo Clemente Romano, iniciador da ideologia do poder, dando continuidade ao artigo passado.

Eusébio, bispo de Cesareia (265-340) e fundador da História Eclesiástica, nos deixou escrito (livro III; c. II) que, com a morte de Tiago, primeiro bispo de Jerusalém, "os apóstolos, os discípulos e os parentes vivos do Salvador juntaram-se para dar-lhe um sucessor e, por consenso unânime, elegeram Simão Pedro". (Parêntese: então, o primeiro sucessor de Jesus e papa, seria Tiago!?!).

Ora, na citada carta aos Coríntios, o bispo de Roma, Clemente, nos confirma que esta regra ainda perdura na Igreja de Jesus. Não só isso, mas, em Nicéia (325), os bispos presentes confirmaram ser este costume ininterrupto.

Hoje, sabemos que o XXII cânon do Concilio de Cartago "proibia aos bispos ordenar padres sem o consentimento dos demais sacerdotes e sem a presença e aprovação dos leigos".

E o bispo de Roma, Leão Magno (440-461) fez uma lei para a sua Igreja, onde se lê que "aquele que por direito terá que mandar em todos, haverá de ser eleito por todos".

É um ato de democracia eclesiástica, sem dúvida, que esconde uma realidade que já era aceita por todos – leia-se, de novo, o que São Leão Magno escreveu: "aquele que por direito terá que mandar em todos...". Fala-se de "direito" e fala-se de "mandar".

Ora, mandar é um ato de jurisdição que implica em "poder" - neste caso, poder eclesiástico que se fundamenta em direitos...

O que é poder eclesiástico? O que são estes direitos? Poder eclesiástico é de difícil definição... É um poder muito elástico, que pode ser esticado no tempo e no espaço, quilómetros afora... Na sua formulação inocente parece algo que tem a ver com a vida da alma... um poder espiritual.

Mas, ao longo dos séculos, passou da alma dos fiéis ao corpo dos fiéis (lembra da Inquisição?) e do corpo dos fiéis passou à terra dos fiéis (lembra a doação de Constantino? e da terra dos fiéis passou aos reinos, ao Ocidente, à terra inteira... (lembra do Tratado de Tordesilhas, em 1494?).

E o poder eclesiástico (elástico como é) se fundamenta em direitos adquiridos. Quais são estes direitos adquiridos dos presbíteros e dos epíscopos?

Para entender isto, voltemos ao começo. Já na época do bispo romano Clemente não era reconhecido à igreja de Roma, no âmbito da cristandade, nenhuma autoridade sobre as demais igrejas do Oriente ou do Ocidente.

Veja-se por exemplo, a luta escandalosa entre Cornélio e Novaciano, na metade do III século, querendo ambos ser bispos de Roma. Foram excomungados por um sínodo romano, mas a resposta definitiva reconhecendo Cornélio como legítimo bispo de Roma, veio do sínodo de Cartago (África).

O mesmo aconteceu quando um sínodo espanhol depôs Marcial, bispo de Mérida, e Basilídio, bispo de Lyon, por terem traído a fé na perseguição de Gallo. Os dois apelaram ao bispo de Roma, Estêvão, que os reintegrou. Mas um outro sínodo de Cartago (África) anulou o ato do bispo de Roma, confirmando a decisão do sínodo espanhol.

Cornélio, bispo de Roma (251-253), gritava que era a ele que competia decidir estas coisas, por ser Roma a capital do império, mas ninguém lhe deu ouvidos.

Assim, quando se tratou de fixar a data da Páscoa, não é o costume da Igreja de Roma que vale, mas o que determinam os concílios provinciais de Cesareia, dq Ponto, da Gallia e da África, que, seguem o exemplo de Alexandria (Egito), enquanto as pretensões de Victor I, bispo de Roma (189-199) foram derrubadas pelo bispo de Éfeso.

Assim, depois da perseguição de Décio é ainda o concilio de Cartago, convocado pelo bispo Cipriano, que resolve a questão da reconciliação dos apóstatas e o bispo de Roma nem mesmo é consultado.

Aconteceu o mesmo com o batismo dado pelos hereges: é ainda o bispo de Cartago, com os demais bispos africanos, que impõe as regras. (Veja: Santo Agostinho; "De Batismo" livro II; c. XV).
Temos dezenas de outros exemplos parecidos com esses que acabamos de citar, como, por exemplo, o caso de Paulo de Samosata; o cisma donatista; a teologia de Ário; etc.

Em todos esses casos, eram os concílios episcopais das diferentes igrejas que impunham o seu parecer, desfazendo, frequentemente, o parecer do bispo de Roma. (Veja: Fleury; "História Eclesiástica"; livro VII; 56).

É pena que quem redigiu a lista dos papas na enciclopédia Mirador, tenha colocado sob o título "principais eventos" muitas afirmações que não têm nenhuma prova histórica.

Esses fatos acima relatados nos colocam já diante de uma situação aceita no mundo cristão de então; uma situação que enquanto mostra a falta do primado romano, nos primeiros séculos, salienta o direito de cada bispo (esteja ele onde estiver) para decidir questões dogmáticas e disciplinares.

Como chegaram mais tarde os bispos a tanto poder? Este será o assunto do próximo artigo.

Autor: Carlo Bússola, professor de Filosofia na UFES

Fonte: Publicado originalmente no jornal “A Tribuna” – Vitória-ES, numa série sob o título “Os Bispos de Roma e a Ideologia do Poder”.

 Nota do IASD Em Foco
Agradecemos à distinta família do insigne Professor Carlo Bússola que, gentilmente, nos autorizou a republicar este riquíssimo material aqui no IASD Em Foco e, na série completa composta de 171 artigos, vamos colocar semanalmente este precioso acervo e legado, fruto de arguta e profunda pesquisa, à disposição dos fiéis leitores deste site. No entanto, lembramos, é vedada a republicação ou postagem deste material sem a expressa autorização dos editores deste site e, posterior, consulta à família do Professor Carlo Bússola – detentora e fiel depositária dos direitos autorais desta obra. Consoante a isso, lembramos ainda que o uso e/ou distribuição deste material – sob quaisquer formas – fora dos limites aqui expostos configura crime, sendo os infratores passíveis das penalidades previstas nas leis.


01/10/2012

VIAGEM AO SOBRENATURAL




As experiências e recordações da infância e da guerra haviam levado Roger Morneau para longe de Deus de tal maneira, que ele agora O odiava. Depois da guerra, Roger foi levado, através de um amigo, a adorar os demónios  Então, ele descobriu as boas novas de um Salvador amoroso, e sentiu o desejo de cortar os laços de adoração aos espíritos.

Neste livro, ele narra sua própria história de como o socorro divino o livrou do terrível mundo do satanismo.

Roger J. Morneau faleceu em 22 de setembro de 1998, aos 73 anos de idade.



ÍNDICE

01. Molestado Pelos Espíritos 8

02. Minha Infância 11

03. Viagem ao Sobrenatural 17

04. A Sala de Adoração dos Espíritos 24

05. Espíritos em Ação 34

06. Pressionado a Assumir um Compromisso 42

07. Da Adoração aos Demônios ao Estudo da Bíblia 46

08. O Estudo da Segunda-Feira 53

09. Estudando em Tempo Emprestado 56

10. O Dia das Promessas 61

11. O Sábado Bíblico 67

12. Novo Amanhecer e Nova Vida 70

13. Episódio de Morte 77

14. Contando as Minhas Bênçãos 83

Epílogo 87

Material Extra 88

> Mapas 89

> Fontes das Imagens 90

> Entrevistas em Vídeo e Artigo em PDF 91

> Informações Adicionais 92

Observação: A versão digitalizada desta obra contém ‘links’ para informações na Internet e alguns detalhes revelados por Roger Morneau em sua “entrevista-testemunho” pessoal, que não foram incluídos neste livro pela editora.

Digitação e Produção em PDF: Gilliard Santos de Farias